CNV, 2021: Entrevista Romeu Leite, campeão SBK
Romeu Leite venceu, finalmente, o Campeonato Nacional na classe de Superbike, depois de competir há numerosos anos no Nacional, onde começou pelas pequenas dois tempos e passou também pela classe de Superstock 600
Muitos dirão que o piloto só consegui este resultado graças à ausência de Ivo Lopes, mas este tinha um projeto internacional bem definido a que deu prioridade, e há sempre a velha máxima de que “para chegar primeiro, primeiro há que chegar!”
Depois, há uma certa justiça poética no facto duma equipa que é basicamente composta de pai e filho bater estruturas muito maiores, mais profissionalizadas e financiadas.
É um título que já vem tarde para o humilde piloto de Lousada, primo do antigo campeão José Leite, a quem o pai Álvaro, ele próprio piloto de sucesso na sua juventude, só deixou começar a correr muito tarde.
Nem tampouco é o primeiro título nacional para o filho, que depois de um começo nas 50 em 2005, foi campeão de 600 em 2010, antes de ascender à classe rainha da velocidade portuguesa.
Impunha-se ouvir os comentários de Romeu Leite acerca da sua época vencedora:
“Nesta última corrida, o objetivo era ser campeão, nunca escondi isso, claro que se pudesse ganhar, era o ideal, mas eu sabia que nos 1:43 zero conseguia rodar em segurança, sem correr grandes riscos…”
“Tudo o que fosse daí para baixo, podia dar certo, podia não dar, e quando outro piloto, o segundo classificado, que não tinha nada a perder, foi para a frente para ganhar, eu teria feito o mesmo no lugar dele.”
“Ele atacou de uma forma correta para ganhar, e dentro dos meus objetivos, eu sabia que não podia era cair, e tentei segurar a minha posição até final… claro que se pudesse ganhar tinha ganho, mas não ia correr riscos!”
“Ainda faltam mais duas corridas mas (com 55 pontos de vantagem) já sou campeão aritmeticamente!”
A seguir, falámos dos primórdios do piloto na velocidade nacional:
“Comecei a correr tarde, só aos 20 anos, considerado muito tarde agora, porque o meu pai também foi corredor e nunca quis que eu corresse.”
“Tinha medo que eu me magoasse, e claro, sim, é um desporto perigoso.”
“Aos 20 anos eu consegui convence-lo e estreei-me com uma 50 num Kartódromo.”
“Correu bem, venci logo duas provas nesse ano e depois fui para as 85 e 600 e ao fim de 17 anos, estou nas 1000!”
O resumo sintético de quase duas décadas de sucessos é típico da humildade de Leite, que continua:
“Os apoios não foram muitos, mas também nunca desistimos, lutamos sempre, e o meu objetivo sempre foi chegar aqui!”
“Hoje conseguimos e estou muito satisfeito!”
“Há antecedentes familiares porque o meu primo José Leite já foi campeão das 125 e depois das 1000 e agora também já há um primo mais novo que está a seguir as minhas pisadas!”
“É uma coisa de família, que já passou de geração em geração!”
“Nunca desistimos, quando não havia dinheiro para treinos, não fazíamos os treinos vínhamos só às corridas e fomos ganhando experiência nas 600 e 1000!”
“Era tudo novo para nós, quando era preciso evoluir algo, suspensões, ou motor, demorávamos muito mais tempo que os outros, não tínhamos a experiência de outras equipas que andavam a correr contra nós, e também faltava a parte económica, para nos ajudar a ter uma telemetria, por exemplo, e levámos mais tempo a lá chegar!”
“A moto era a mesma, as corridas eram as mesmas, portanto acho que conseguimos juntar toda aquela informação que já tínhamos no princípio do ano e ser consistentes.”
“Quando começámos a baixar para os 1:44, os nossos adversários já iam nos 1:43, quando chegámos aos 43, já eles iam nos 42 e assim por diante, andávamos sempre atrasados…”
“Ao longo de todo o campeonato, ficámos sempre em primeiro segundo e conseguimos assim!”
“O meu pai é mecânico, mas sempre trabalhou nas motos a dois tempos e nem gosta muito de motores a quatro tempos porque é um mecânico à antiga, gostava de fazer a preparação das 2 tempos, limar aqui e ali e ir desenvolvendo os motores mais pequenos.”
“Ele acabou por passar para esta classe por minha causa, porque sabia que eu queria evoluir… na altura cheguei a ter uma proposta, mas depois não se concretizou e ele fez um esforço para me ajudar!”
“Não temos grandes meios, ele cuida da mecânica, lá está, e a nível de recolha de dados, para sermos um bocadinho mais sofisticados, sou eu que os leio…”
“Muitas vezes, não tínhamos meio de recolher informação, não treinávamos tanto, as coisas demoravam. Este ano claro, a ausência do Ivo facilitou, mas também pagou dividendos toda a recolha de informação que temos vindo a fazer.”
De resto, para lá do pai Álvaro, a equipa conta ainda com a esposa do piloto Filipa, que vai ajudando como pode, especialmente com apoio moral…
“Eu ás vezes desanimava e ela é que me dizia, somos nós sozinhos contra equipas muito maiores e estás a ganhar, que mais queres ?!”
“Quando precisamos de fazer uma afinação mais complexa, não temos meios em casa, não temos sequer acesso a um banco de ensaio!”
“Por tudo isto é que levou também todo este tempo a conseguirmos chegar, porque também somos do Norte e lá é um bocadinho mais difícil termos acesso a todas essas coisas…e não se correr em Braga não ajudou, eu acho que foi um bocadinho de lobby dos pilotos do sul, porque não havia nada assim tão errado com o circuito, para mim vir treinar ao Estoril ou Portimão custa uma fortuna e Braga era mesmo ao pé!”
Longe de parar com o título, Leite quer continuar a evoluir:
“Não acredito que tenha atingido o meu potencial, precisamos de baixar mais, eu acredito que consigo baixar mais, mas precisamos de alguém que nos auxilie nessa parte, que me consiga ler dados, que me consiga ajudar, para eu conseguir dar o próximo passo!”
Se eu consultar o meu Lap timer neste momento, consigo dar todas as voltas quase iguais, 1:43:10, por aí!”
“Sou muito regular, mas não consigo ultrapassar isso neste momento, lá está, porque falta alguém ao meu lado que saiba interpretar os dados e dizer-me o que fazer a seguir!”
“Consigo atingir o limite daquilo que eu acho mas depois preciso de ajuda, é muito importante para conseguirmos evoluir com estas motos e são os passos que eu tenho que dar no próximo ano, se não tiver essas condições, não tenciono continuar!””
“De resto a moto está completamente de origem, temos os apoios da Jasil e Campobelo, que é uma marca de sapatos, da Moto Fundador, que é o concessionário Yamaha de Guimarães, que nos ajuda imenso com peças, e claro, nós próprios…”
“O meu pai e um tio que é sócio, temos uma oficina de motos e isso também ajuda.”
Não temos grandes eletrónicas nem nada disso, mas jogámos um bocadinho com o que sabíamos, ou seja tínhamos esta moto afinada para isto, mas lutámos para chegar até aqui…”
“Por exemplo esta moto está muito bem afinada mas em velocidade de ponta, está muito abaixo…”
“É uma mota de 2018 é a primeira geração desta nova R1, mas em velocidade, por exemplo, não conseguia sequer acompanhar o cone de ar de uma moto como a Aprilia do Magalhães, mas eu não tinha hipótese hipótese de ter uma moto de 2021, que eu sei que já tem outras coisas diferentes a nível da eletrónica!”
“Nós temos tudo de origem, há cames de Kit caríssimas, da YEC, mas nós não temos, uma embraiagem de kit que nós não temos, na nossa é tudo de origem e todas essas pequenas coisas acabam por fazer muita diferença na velocidade!”
“Eu pessoalmente, gostei da condução de uma quatro tempos, é uma condução diferente, e o problema com as dois tempos é que de manhã para a tarde, com os carburadores, tudo varia, de manhã tínhamos a moto impecável e à tarde com condições diferentes, a moto não se portava da mesma maneira.”
“Em termos da condução, fez-me um bocado de impressão a travagem motor de início, mas agora com as embraiagem deslizantes, ajudou muito, isto agora é muito mais parecido com um motor a dois tempos e acho que isso até me ajudou porque eu tinha muita experiência com motores a dois tempos e isto veio muito mais ao encontro da minha condução e ajudou-me bastante!”