Técnica MotoGP: 1 – A Honda RC213V
Começámos pela Honda porque lidera o Campeonato e tem dominado a MotoGP desde 2013, sendo a exceção a vitória isolada da Yamaha em 2015 com Jorge Lorenzo.
A RCV foi obrigada pelas regras que determinam 4 cilindros e até 1000cc de capacidade para um peso máximo de 158 Kg, a reverter para esse formato, sendo originalmente um V5. Nos anos anteriores, o motor lutava com falta de potência, e logo aceleração, especialmente em relação às Ducati. Para 2019, apareceu com mais potência, estimada agora em cerca de 250 cavalos às 16.000 rpm, o que permitiu a Márquez vencer mas caindo muito menos que anteriormente, ou seja, arriscando menos.
Como sempre quando se consegue um incremento de potência, voltam a descobrir-se lacunas na ciclística, que volta a torcer sob a força da potência a ser passada ao chão pelos pneus, e para contrariar isso, a Honda usou a partir de Brno um quadro com reforços estratégicos de carbono em certas zonas das vigas principais.
O que se pretende idealmente não é um quadro totalmente rígido e livre de flexão, que “empurraria” demais os pneus, mas flexão controlada, de preferência longitudinal (em linha com as rodas) mas não transversal (em que as rodas desalinhariam sob a torsão do chassis, com qualquer dono de uma Vespa já sentiu ao curvar)
Depois, ganha a luta peça procura de mais potência, fica a luta eterna sobre como a colocar no chão da forma mais eficiente. Aqui, os gostos, talento e estilo de condução do piloto são a medida crítica: Alguns como Márquez, Viñales ou Petrucci preferem a traseira a escorregar, outros exigem total suavidade para manter alta velocidade em curva, como Lorenzo ou Quartararo. Se a moto tem dificuldades em providenciar isso, temos os problemas de adaptação observados este ano.
A forma de fazer a potência passar ao chão da melhor maneira (a que permita aceleração mais imediata conservando ao mesmo tempo ao máximo os pneus) é controlada por muitas variáveis:
A velocidade e razão do hidráulico de afundamento e retorno da suspensão, ângulo de direção, posição do pivot do braço oscilante e comprimento total deste, são logo à partida alguns, mesmo antes de estarmos a falar de misturas e carcaças de pneus, que tendem a levar a culpa de efeitos frequentemente causados pelo chassis e não pela borracha.
Neste momento, e Márquez é o primeiro a admiti-lo, para extrair o melhor da RC213V, o Espanhol tem de usar ângulos de inclinação incríveis, que chegam a atingir os 65 graus. Nesses extremos, derrapagem é praticamente uma constante e cair é extremamente fácil, o que quer dizer que basicamente ao longo de uma corrida o pequeno Catalão está mais perto dos limites – ou para lá deles! – do que qualquer outro, por isso vence e é o único a vencer com a Honda neste momento.
Márquez é dos mais severos do Campeonato nas travagens e para tal dispõe de discos Brembo de carbono. A tradicional relutância da Honda em utilizar soluções fora do seu espetro de empresas – A Showa para a suspensão e Nissin para as travagens- ilustra bem a superioridade da marca Italiana. No entanto, em situações de chuva os pilotos preferem discos de aço, que dão travagem mais linear e neste caso, a marca usa discos Yutaka de aço. Até a posição dos pedais tem influência na sensação do piloto com a moto e pode ser ajustada a seu gosto.
Do lado de Lorenzo, cujo estilo exige e beneficia de uma velocidade altíssima em curva, não cair da moto, literalmente, é uma consideração importante, por isso quer na RCV quer o ano passado na Ducati a equipa adaptou-lhe formas plásticas no depósito para lhe permitir agarrar-se melhor, sobretudo na fase de travagem e inserção em curva.
O seu descontrolo na Catalunha, quando confundiu pilotagem com bowling e eliminou 3 dos quatro principais candidatos ao título de uma assentada, mostra que ainda não estavam bem lá nessa fase. Exigindo ferocidade e uma técnica de mudar de direção repentinamente em vez de curvas suaves a alta velocidade, é improvável que a HRC mude de direção quando Márquez vence com a moto como ela está… e talvez a RC213V nunca venha a permitir a Lorenzo vencer… mesmo que Márquez lhe desse essa hipótese!