MotoGP – Rivalidades: Quando as coisas aquecem – 1ª PARTE

Por a 15 Dezembro 2017 12:37

O intenso duelo entre Valentino Rossi e Marc Márquez no MotoGP foi só mais um episódio numa longa lista de rivalidades na sexagenária história do Mundial de Motociclismo. Nomes como Hailwood e Agostini, Rainey e Schwantz ou Rossi e Biaggi foram muito mais do que simples adversários em pista…

O pugilismo teve Muhammad Ali e Joe Frazier. O basquetebol teve Magic Johnson e Larry Bird. A Fórmula 1 teve Alain Prost e Ayrton Senna. Os ralis tiveram Sébastien Loeb e Sébastien Ogier. Toda a história do desporto mundial está polvilhada de rivalidades intensas, embates de estilos e personalidades que superaram os limites humanos na presença de um adversário de igual talento e determinação. Esta dicotomia torna competições como o Mundial de Motociclismo numa espécie de romance literário, alimentado de tempos a tempos pela inimizade entre duas personagens de facões opostas. Aquilo que Valentino Rossi e Marc Márquez protagonizaram em 2015 é só mais um capítulo nesta apaixonante telenovela seguida por milhões. Relembre com o AutoSport outros episódios de rivalidade visceral no mundo do motociclismo.

Mike Hailwood vs Giacomo Agostini

Esta talvez tenha sido a primeira grande rivalidade do Campeonato do Mundo de Motociclismo, ou pelo menos aquela que captou inicialmente a atenção do público que seguia a modalidade. Um britânico e um italiano, duas personalidades diferentes mas cujas histórias de vida partilhavam alguns pontos de contacto até ambos se encontrarem na MV Agusta em 1965.

Mike ‘The Bike’ foi a primeira verdadeira superstar do motociclismo, um predestinado vindo de uma família rica – o pai fez fortuna a vender motos na Grã-Bretanha – e que em miúdo aprendeu a pilotar num terreno de 30 mil metros quadrados onde desgastou uma oval das constantes voltas que fazia aos domingos a seguir à missa. Um fenómeno que teve sempre as melhores motos que o dinheiro podia comprar… mas que as levava ao limite com o à-vontade dos predestinados.

Dois anos mais novo, Agostini também vinha de uma família abastada – o pai era um rico industrial de Bergamo – mas o jovem italiano teve primeiro de convencer o difícil conde Agusta – num episódio tipo ‘O Padrinho’ – a dar-lhe uma oportunidade em 1965 como companheiro de Hailwood. O britânico tinha sido campeão pela primeira vez nas 250cc em 1961, com um pequena firma japonesa chamada… Honda. Seguiram-se mais quatro títulos na classe-rainha, das 500cc, com a MV Agusta, o último dos quais em 1965 já com o jovem ‘Ago’ como companheiro de equipa. O italiano terminou seis corridas no segundo lugar logo atrás de Hailwood, estudando o seu futuro rival. No final do ano, Hailwood deixou a marca italiana cansado do feitio do conde Agusta e acusando-o de preferir o jovem Agostini. À espera de Mike ‘The Bike’ estava Soichiro Honda, que queria a todo o custo acabar com o domínio da MV Agusta no Mundial. Foi aí que a rivalidade de Agostini e Hailwood (assim como da MV Agusta e Honda) atingiu o seu apogeu, alastrando inclusive ao lendário TT da Ilha de Man. O britânico e a Honda ainda tiveram o ‘gostinho’ de bater os italianos no Mundial de 350cc por duas vezes, mas o binómio Agostini-MV Agusta já estava no seu auge na classe-rainha, onde Agostini seria campeão sete anos consecutivos. Hailwood retirou-se do Mundial muito antes, em 1967, mas a rivalidade entre os populares ‘The Bike’ e ‘Ago’ povoou o imaginário dos adeptos e da imprensa.

Barry Sheene vs Kenny Roberts

Bazza’ e ‘King Kenny’. Depois de Hailwood e Agostini, a história repetia-se: um era a estrela reinante, a figura irreverente idolatrada por milhões; o outro era o aspirante talentoso, focado unicamente em bater o campeão em título. Quando Kenny Roberts atravessou o Atlântico vindo de uma carreira impressionante nas dirt tracks americanas, Barry Sheene era uma espécie de ‘Valentino Rossi dos anos 70’. O britânico tinha sido campeão do Mundo de 500cc por duas vezes com a Suzuki mas era o seu estilo irreverente, dentro e fora de pista, que o tornava numa lenda do motociclismo. Não era raro ver Sheene a fumar um cigarro na grelha de partida através de um orifício furado no capacete (!). Ainda mais frequente era ver o inglês rodeado de mulheres bonitas e com um sorriso de playboy.

Roberts era o completo oposto. O rude (e determinado) californiano vivia e respirava corridas. O estilo de vida – e de pilotagem – de ‘Bazza’ eram uma afronta para a personalidade introvertida de Roberts, que só admitia um único resultado na sua carreira nos Grandes Prémios: chegar a campeão do Mundo. Algo que King Kenny conseguiu logo na sua primeira época na classe-rainha, em 1978, um feito que só Marc Márquez conseguiu repetir 35 anos depois.

Quando Roberts começou a bater o campeão Sheene na primeira metade de 1978, o inglês começou a perder a paciência com o novato vindo dos States. E a rivalidade escalou até ao famoso GP da Grã-Bretanha de 1979, em Silverstone, quando Sheene ultrapassou Roberts e levantou o dedo do meio para o seu adversário… que o passou logo a seguir. Certo dia, o americano disse que “eu só me levanto da cama de manhã para bater o Barry Sheene”. O inglês respondeu à imprensa quando esta lhe perguntou o que achava de Roberts como piloto de desenvolvimento. “Ele nem consegue desenvolver uma gripe”, afirmou Bazza. O ambiente entre ambos desanuviou-se quando ambos se retiraram e Roberts reconheceu a importância da rivalidade de Sheene quando este morreu de cancro, em 2003.

Kenny Roberts vs Freddie Spencer

Depois de Barry Sheene, ‘King Kenny’ Roberts teria um outro adversário de peso no Mundial de 500cc: Freddie Spencer. ‘Fast Freddie’ era um talento precoce do motociclismo: depois de mentir sobre a sua idade para poder correr (“Era suposto termos 16 anos. Eu tive 16 anos durante três anos seguidos”, brincou), venceu o campeonato norte-americano de 250cc na frente de Eddie Lawson e aos 18 anos bateu os campeões de 500cc Barry Sheene e Kenny Roberts no Desafio Transatlântico, antes de ganhar o seu primeiro GP aos 20 anos.

Por outro lado, em 1983 Roberts já era o ‘Rei’ após três títulos com a Yamaha e anunciando que essa seria a sua última época no Mundial mas longe de pensar noutra coisa que não fosse numa saída em grande. Só que ‘Fast Freddie’ começou o ano muito forte, com a ágil Honda NS500 de três cilindros, vencendo cinco das sete primeiras corridas. Consistente como sempre, Roberts recuperou e venceu três GP seguidos colocando pressão sobre o seu jovem compatriota. O pico da emoção aconteceu no célebre GP da Suécia de 1983, na pista de Anderstorp. Roberts e Spencer trocaram de posições durante toda a corrida mas o piloto da Yamaha parecia ter a vitória assegurada… até à última curva. Numa manobra desesperada, Spencer mergulhou a sua Honda no interior da curva mas não tinha espaço suficiente para travar e saiu para a gravilha obrigando Roberts a fazer o mesmo. Spencer foi mais rápido a regressar ao asfalto e acabou por ganhar a corrida, com Roberts em segundo e a perder o Mundial no final do ano por… dois pontos.

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